Aos 101 anos, lúcido e atento, H. G. Flieg (1923-2024) faleceu em São Paulo no início de setembro. A longevidade, porém, não o deixou isolado ou esquecido. Ativo em áreas como publicidade e fotografia industrial entre os anos 1940 e o início dos anos 1980, Flieg tornara-se desde então uma figura de referência.
A consciência da relevância documental de sua produção sobre o panorama paulistano nesses anos é um traço distintivo do fotógrafo. Desde sua primeira grande retrospectiva em agosto de 1981 no MIS São Paulo: Hans Günter Flieg: 40 anos de fotografia, com breve catálogo, essa presença foi lentamente elaborada. A incorporação do acervo de imagens em 2006 pelo Instituto Moreira Salles estabeleceu, por fim, um campo seguro para preservação e pesquisas por novas gerações de historiadores e especialistas diversos.
Em 2023, ano do centenário de nascimento, é homenageado com a mostra individual flieg. tudo é sólido, no IMS Paulista, com curadoria de Sergio Burgi, realizada entre agosto daquele ano e fevereiro do seguinte. Em abril, contudo, recebera homenagem inesperada com referência no cartaz, no catálogo e trailers do festival de cinema documentário É tudo verdade 2023, organizado por Amir Labaki, sem mesmo haver uma relação direta de sua obra com o cinema, fato que expressa um alcance além do campo especializado. Em janeiro do ano seguinte, a mostra no IMS é premiada pela APCA.
Sua morte acontece então em momento importante no percurso pessoal, atendidos seus desejos desde os anos 1980 em conquistar uma forma de preservação da obra e seu tempo. Essa última expressão é, em verdade, característica de Hans Flieg, sempre disponível para conversar sobre suas imagens mas atento ao sistema de produção e circulação das fotografias em cada campo em que atuou como publicidade ou documentação industrial e patrimonial, atento a parceiros e agentes fundamentais para essas realizações.
Os necrológios, desde o ensaio de primeira hora por Nana Rubin no site do IMS, chegam aos jornais locais, em 12 de outubro, por Diego Alejandro, na Folha de S.Paulo, e no dia seguinte em O Estado de S. Paulo, escrito por autor próximo ao fotógrafo – Luis Krausz.
Difícil pensar agora em tema que fosse oportuno para registro neste site Flieg de Bolso, produzido através de uma colaboração longa com Flieg. A decisão final foi enfocar algo para o qual o fotógrafo sempre esteve disponível: falar sobre suas obras, a produção e contexto das imagens. Escolhi algo que me interessou de imediato quando o conheci quarenta anos atrás: o calendário que fizera muito jovem para a indústria de Pirelli, que no momento investia com destaque na manufatura de pneus.
Calendário Pirelli 1949, folha para mês de janeiro. Acervo IMS.
“Aos 25 anos, H. G. Flieg é comissionado pela agência Standard Propaganda para seu primeiro trabalho de envergadura. O calendário Pirelli para 1949 é relevante por tomar como ponto de partida o livro Arbeit!, de Paul Wolff (1937). O calendário permite discutir a difusão da fotografia moderna, a publicidade e outras faces da modernidade brasileira em construção, bem como identificar procedimentos de longa duração na obra do fotógrafo.”
ensaio O fotógrafo quando jovem: o calendário Pirelli para 1949
veja os links para o texto completo do ensaio
após as imagens
Calendário Pirelli 1949, folha para mês de maio. Acervo IMS.
Ensaio apresentado no evento Modernismos em diálogo: o papel social da arte e da fotografia a partir da obras de Hans Günter Flieg, organizado por Helouise Costa e Marcos Fabris, realizado em: MAC-USP (SP, 13 a 15.04.2015), disponível em formato PDF em 2021.
disponível (em separata) em:
https://archive.org/details/mendes-r-2015-modernismos-em-dialogo-flieg-fotografo-quando-jovem
disponível (anais, completo) em: http://doi.org/10.11606/9788594195180 (2021)